Hoje acordei com o barulho de chuva forte sobre telhado de pedra, o que me trouxe um certo conforto por não estar em alguma escalada.

Pelo meus planos eu deveria estar descendo hoje dos últimos “4” Quatro Mil que deveria escalar, mas meu amigo italiano acabou desistindo, dizendo que se fossemos, a tempestade que chegou hoje de manhã, teria nos alcançado lá em cima ontem à noite. Bem, essa foi a primeira desculpa para não ir, depois disse que o trem sairia muito tarde de Chamonix para Montenvers, assim chegaríamos tarde no refugio, sem tempo para descansar para uma investida de pelo menos umas 20 horas. Como fiquei insistindo, afinal eu tinha certeza que teríamos dois dias de tempo excelente, ele veio com uma última desculpa, teria que levar dois clientes para o Grand Paradiso (4.061m).

Compreendo que como guia ele tenha que garantir o seu sustento, mas nossa investida ao maciço da Aiguille Verte foi combinada com bastante antecedência e ele mesmo disse que eu não precisava mais me preocupar com companheiro para aquela difícil empreitada. Na verdade ele estava abalado por motivos bem piores.

Infelizmente neste mês de agosto tivemos vários acidentes fatais, onde guia e cliente morreram no Grand Combin (4.314m) e no Matterhorn (4.478m), em razão de quedas de pedras soltas. No Mont Blanc (4.807m), em razão de queda da cordada, morreu uma cliente e um guia valdostano se encontra gravemente ferido. A comunidade de guias está abalada, bem como todos os alpinistas profissionais que percebem que as condições das montanhas estão deterioradas.

Está tudo muito seco, sem a neve que ao congelar evita a queda de pedras. Os glaciares estão com as gretas bem abertas e muitas rimayas (greta terminal, na base das paredes) já estão intransponíveis, tanto que esta semana o Refugio Gonella, base para a escalada da via normal italiana ao Mont Blanc, fecha as suas portas, pois o glaciar logo acima está intransitável e bastante bombardeado por quedas de pedras. No maciço do Mont Blanc ocorreram cinco deslizamento de rocha significativos, o último semana passada na parte inferior do esporão norte das Grandes Jorasses. É o quinto ano consecutivo extremamente seco nos Alpes, a temporada que deveria ir até início de setembro, já está praticamente encerrada.

E o que fazer se ainda tenho “4” Quatro Mil para escalar? Primeiro ter paciência, esperar as condições melhorarem! O tempo deve ficar bem ruim nesta semana, a temperatura deve baixar, a isoterma 0º que estava beirando os 4.800m hoje já baixou para 3.700m, e amanhã deve baixar para 3.400m. Está nevando agora acima dos 3.700m, o que vai ajudar a evitar a queda de pedras. Então, assim que esta instabilidade passar, e antes que volte a esquentar novamente, será a hora de eu tentar finalizar a escalada de todos os Quatro Mil dos Alpes.

Sim, um problema é um bom companheiro! Mas já tenho duas excelentes opções brasileiras, se os períodos de tempo bom se encaixarem com a disponibilidade deles, vai dar tudo certo!

Vamos, como sempre, com muito cuidado, aproveitando as oportunidades!

Parece que tudo tinha que acontecer assim mesmo! Eu não acredito em coincidências, e muita coisa incrível já aconteceu nesta temporada, dando um final feliz à situações bem complicadas. Deus queira que seja assim, nas importantes e decisivas escaladas deste desafiador projeto que estou enfrentando!

Um bom exemplo, aliás, dois bons exemplos, foram a travessia do Taschhorn (4.491m) / Dom de Mischabel (4.545m) e a travessia do Schreckhorn (4.078m) / Lauteraarhorn (4.042m). Não tinha companheiro, estava chovendo, e todo mundo dizia que era melhor não ir porque as condições não eram das melhores, mas companheiros do Brasil apareceram, fomos com cuidado e muita fé, e fizemos!

Continuo contanto com a sua energia positiva, e muita Fé!

Namastê,

Waldemar Niclevicz

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QUATRO MIL ESCALADOS:
em anos anteriores = 10
em 2018 = 37
em 2019 = 31
Total 78, FALTAM 4 !

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Os Quatro Mil dos Alpes que faltam ser escalados:

  1. Les Droites (4.000m) França
  2. Aiguille Verte (4.122m) França
  3. Grande Rocheuses (4.102m) França
  4. Aiguille du Jardin (4.035m) França